Exterior de região que nutre buraco negro é observado pela 1ª vez

Estudo liderado por cientistas do Brasil resultou em novo limite para o tamanho dos discos de acreção, estruturas rodopiantes de gás e poeira que alimentam os buracos negros

Pela primeira vez, astrônomos observaram o exterior da parte que alimenta um buraco negro supermassivo, conhecida como disco de acreção. Os registros, publicados na revista The Astrophysical Journal Letters em 8 de agosto, foram feitos no Havaí pelo telescópio Geminini Norte, do Observatório Internacional Gemini.

O estudo é liderado por Denimara Dias dos Santos, doutoranda do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em colaboração com outro pesquisador da mesma instituição, Alberto Rodriguez-Ardila, que também atua no Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), em Minas Gerais. Colaboraram também Swayamtrupta Panda e Murilo Marinello, do LNA.

O disco de acreção, uma região giratória de gás e poeira na órbita do buraco negro, está localizado na galáxia III Zw 002. As novas observações resultaram em um novo limite para o tamanho de estruturas rodopiantes como essa.

Essas regiões giratórias emitem grandes quantidades de energia ao longo de todo o espectro eletromagnético, que inclui desde raios gama e raios X de alta energia (que passam pela luz visível) até ondas de rádio e infravermelho.

Impressão artística de buraco negro supermassivo com disco de acreção orbitando-o. As anotações mostram perfil hipotético de "pico duplo" com setas indicando onde cada "pico" se origina na região da linha mais larga — Foto: NOIRLab/NSF/AURA/P. Marenfeld

Como a maioria dos discos de acreção não pode ser vista por imagens diretas devido a sua distância extrema e tamanho relativamente pequeno, os astrônomos usam os espectros de luz emitidos de dentro do disco para caracterizar seu tamanho e com5portamento.

Então, a equipe detectou o disco em questão a partir de duas linhas de emissão no infravermelho próximo. Essas linhas ocorrem quando um átomo em estado excitado cai para um nível de energia mais baixo, liberando luz.

Enquanto no átomo a luz emitida possui um comprimento de onda discreto (um tipo de “impressão digital”), com linhas de emissão representadas por pontas finas e nítidas, no disco de acreção, a história é bem diferente. Nesse vórtice rodopiante, onde o gás se move a milhares de km por segundo, as linhas ficam mais rasas.

A área onde essas linhas se originam é chamada de região da linha larga. No estudo, o que os cientistas fizeram é detectar na linha larga os chamados “perfis de pico duplo” — raros padrões de linhas de emissão que evidenciam o disco de acreção sem precisar fotografá-lo.

Nas poucas fontes em que já foi observado, o “pico duplo” foi encontrado nas linhas H-alfa e H-beta dos átomos de hidrogênio que aparecem na faixa de comprimento de onda visível. Dessa vez, os cientistas detectaram isso na linha Paschen-alfa (hidrogênio) e linha OI (oxigênio neutro).

“Não sabíamos anteriormente que a galáxia III Zw 002 tinha esse perfil de pico duplo, mas quando reduzimos os dados vimos o pico duplo muito claramente”, disse Rodriguez-Ardila, em comunicado. "Na verdade, reduzimos os dados muitas vezes pensando que poderia ser um erro, mas sempre vimos o mesmo resultado emocionante.”

Observações de 2003 da galáxia III Zw 002 no visível revelaram evidências de um disco de acreção, e um estudo de 2012 encontrou resultados semelhantes. Nove anos depois, Rodriguez-Ardila e sua equipe decidiram complementar essas descobertas com observações no infravermelho próximo.

Além de confirmarem a presença do disco de acreção, os novos achados avançam a compreensão dos astrônomos sobre a linha larga, que se descobriu ter um ângulo de inclinação de 18 graus em relação aos observadores na Terra, enquanto o buraco negro supermassivo em seu centro tem de 400 a 900 milhões de vezes a massa do Sol.

"Pela primeira vez, a detecção de tais perfis de pico duplo impõe restrições firmes à geometria de uma região que de outra forma não seria possível resolver", disse o pesquisador. “Agora temos evidências claras do processo de alimentação e da estrutura interna de uma galáxia ativa.”

Com informações da Revistagalileu.

0 Comentários